As grandes companhias brasileiras seguem o modelo completo de
contabilidade padronizado pela Lei 11.638, de 2007. No entanto, muitas
das pequenas e médias empresas (MPEs) ainda não conseguiram se adaptar
aos padrões exigidos
Com o advento das normas internacionais, instituída em 2007 no
Brasil, a International Financial Reporting Standards (IFRS) acabou
mudando a cara da contabilidade no País. De acordo com o Conselho
Federal de Contabilidade (CFC), órgão responsável pela fiscalização
dessas regras no Brasil, as instituições de grande porte já estão
praticamente todas modernizadas, porém, as pequenas e médias empresas
(MPEs) encontram dificuldades em se adaptar à Resolução n° 1.255/09 (NBC
T 19.41), que trata exatamente dessa adoção por essas companhias. Os
balanços de aproximadamente 6 milhões de MPEs já deveriam estar
adaptados, desde 2010.
Atendendo aos apelos das entidades federais que representam a classe
contábil e empresarial no Brasil, o CFC criou um grupo de trabalho que
estuda regras diferenciadas para as MPEs. “É uma adaptação da IFRS e
isso está sendo analisado”, explica o conselheiro da Câmara Técnica do
Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Jádson Ricarte, que acredita
que, até o final de julho, o órgão deverá ter uma solução para o
problema. Porém, ele faz um alerta e avisa que, “tão logo sejam
definidas essas novas resoluções, a adaptação deverá ser imediata”.
A padronização mundial dos registros contábeis tornou os balanços
mais transparentes e adequados a uma linguagem internacional. No
entanto, o presidente da Federação Nacional das Empresas de Serviços
Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e
Pesquisas (Fenacon), Valdir Pietrobon, critica o comportamento das MPEs
que, segundo ele, nem chegam a fazer contabilidade, embora garanta que a
cultura dos empresários com relação a isso já esteja mudando. Pietrobon
questionou junto ao CFC a exigência da aplicação das regras às empresas
de pequeno porte já que, conforme ele, é uma realidade a inexistência
de um sistema contábil adequado. “Para que aplicar as regras agora, se
essas companhias não possuem aplicações em bolsa, nem são empresas de
capital aberto”, argumenta o presidente, que espera uma resposta
positiva do Conselho com relação às alterações pleiteadas pelas
entidades. “Estamos trabalhando para que haja mudanças e as normas
entrem gradativamente para que, daqui a dois anos, se possa atingir aos
poucos todas as instituições”, destaca.
Ricarte reconhece que as MPEs estão com certa dificuldade, mas ele
responsabiliza os próprios contadores por isso, e diz que eles fazem
apenas o livro caixa dessas companhias. “Infelizmente, alguns colegas
não fazem contabilidade como deveriam fazer”, argumenta. Segundo ele, a
Receita Federal permite que as empresas integrantes do Simples, por
exemplo, façam apenas a contabilização do que entra e sai. “Os colegas
entendem ser mais fácil fazer o livro caixa, mas isso não é
contabilidade”, critica. Para ele, a forma exigida pela RF é mais
difícil do que aplicar as regras. Apesar disso, Ricarte diz que até
mesmo o modelo da Receita é feito por uma minoria de profissionais.
Conforme o conselheiro, a fiscalização para que as empresas tenham
contabilidade e dentro da lei é missão dos conselhos regionais. Ele
destaca que as normas internacionais mudaram muito pouco a contabilidade
brasileira.
“Mudou o julgamento da essência sobre a forma”, filosofa. Para ele, a
IFRS melhorou os padrões contábeis e valorizou ainda mais a profissão.
“Os colegas ainda não perceberam que não tem mais volta”, frisou. O
conselheiro do CFC se diz particularmente contra uma nova modalidade
contábil adaptada às MPEs. “As nossas resoluções atendem plenamente a
qualquer tipo de empresa. Não há razão para se ter outra”, opinou. “Os
contadores precisam deixar de serem darfistas, os que só fazem cálculos
tributários para as Darfs”, desabafa. Ele acrescenta ainda que os
colegas têm “preguiça e não fazem o que precisa ser feito”. “Minha
esperança é que todas as empresas tenham contabilidade, pois é uma
ferramenta de gestão que ajuda os empresários a decidir sobre os seus
negócios”, finaliza.
Contador propõe maior proporcionalidade e flexibilização nas normas internacionais
A adoção do IFRS pelo Brasil afeta diretamente os escritórios de
contabilidade e os fornecedores de software de gestão, que precisam ser
adaptados ao novo modelo. As regras vêm sendo implementadas desde 2008,
mudando a rotina das empresas contábeis e exigindo ainda mais dos
profissionais do ramo.
No entanto, a maioria dos pequenos e médios empresários está
“esperneando” para cumprir as regras. Pelo menos essa é a observação do
contador e vice-presidente de Gestão do CRC-RS, Antônio Carlos de Castro
Palácios. Em sua opinião, deve haver proporcionalidade e flexibilidade
na exigência da aplicação das normas (NBC T 19.41).
Segundo Palácios, essas companhias não possuem controles eficientes e
há muitas mudanças a serem observadas. No caso de leasing, por exemplo,
ele explica que a contabilidade hoje é classificada em despesa, mas com
as novas regras ela passa para o imobilizado. “A Receita Federal não
mudou as regras e essa flexibilização poderia continuar”, justifica o
contador. “O Brasil se precipitou demais, mas agora a ficha está
caindo”, diz.
No escritório de Palácios, grande parte das MPEs ainda não adotaram
as normas e ele acha necessário implementar para que elas não fiquem
inadimplentes.
Mesmo que os prazos sejam prorrogados ou havendo mudanças na
normatização, o CRC-RS diz que os contadores precisam se preparar e,
para isso, o Conselho vem oferecendo cursos e seminários para ajudar na
dura tarefa dos profissionais.
Pesquisa demonstra o descontentamento dos empresários
Pesquisa realizada pela WK Sistemas, empresa líder no mercado de
soluções contábeis e fiscais no Brasil, confirma a observação dos
profissionais da área. O estudo demonstrou que nem todas as empresas
parecem estar satisfeitas com o prazo estipulado pelo CFC na resolução
1.255/2009. Das 398 pessoas consultadas, 65,1% defendem que as empresas
precisam de mais tempo para se adaptar às novas regras. Já outros 46%
acham que o novo sistema deveria vir acompanhado de ações do governo.
A pesquisa também revelou que nem todos concordam com a
obrigatoriedade da implantação, sendo que 15,7% dos entrevistados
defendem que a adesão deveria ser optativa, enquanto que 16,9% acham que
deveriam ser obrigatórias apenas para as grandes empresas.
Os que acreditam que o IFRS deveria ser aplicado a todas as empresas,
independentemente do porte, somam 50,3%. Outro dado apontado pela WK
Sistemas é que apenas 23,6% conhecem parcialmente a IFRS, 21,9%
desconhecem completamente e 54,5% afirmaram conhecer superficialmente o
assunto. Para 75,1%, os efeitos da implantação do IFRS serão benéficos
para a contabilidade das empresas, tornando os relatórios padronizados.
Para 46,1%, este não é o momento certo para a implantação do IFRS, pois o
governo deveria promover antes uma reforma tributária. Já para 34,8%, o
assunto é prioridade e está sendo implantado no momento certo. Outros
19,1% disseram-se sem argumentos para opinar.
A contadora da WK Sistemas Graziele França entende a resistência das
empresas e dos colegas contadores, mas acredita que o próprio mercado
começará a exigir que as MPEs estejam enquadradas, visto que a IFRS
proporciona mais transparência e segurança. Ela explica que, ao realizar
operações financeiras, os bancos se sentirão mais seguros em trabalhar
com as companhias que estejam modernizadas e isso poderá ser parâmetros
para tomada de empréstimos, por exemplo.
Segundo Graziele, a explicação para essa oposição é o
desconhecimento, além da falta de infraestrutura das companhias. “Falta
estudo e softwares adequados para tantas obrigações tributárias”,
justifica. Ela acredita que o aprofundamento é fundamental para que a
contabilidade brasileira possa estar finalmente padronizada.
Conforme a especialista, no Brasil existem duas contabilidades, uma
que atende ao fisco e outra ao sistema societário, e essa realidade
precisa ser modificada. Além disso, Graziele diz que não é mais viável a
realização de fluxos de caixa em planilhas em Excel, e as empresas
precisam se atualizar para melhorar seus controles de gestão.
Fonte: Jornal do Comércio RS, via Notícias fiscais .
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